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O que um bang-bang pode te ensinar sobre o propósito da marca.

A ausência de novos e bons filmes de bang-bang nas plataformas de streaming me levaram a pesquisar no YouTube. Para um adepto do gênero western, há um prato cheio ali. A maioria são Spaghetti-Westerns, reconhecíveis pelos roteiros previsíveis e, geralmente, produções simples. Ainda assim, um bom entretenimento.

De repente, me deparo com o filme “The Magnificent Seven”. O que me chamou a atenção foram os atores: Yul Brynner, Steve McQueen, Charles Bronson, James Coburn e Robert Vaughn, entre outros. É como se reuníssemos hoje Denzel Washington, Mel Gibson, Tom Cruise, Brad Pitt e Keanu Reeves em um único filme.

Decidi assistir e vi de cara que era um filme que já havia visto anos atrás. Como não lembrava do final, resolvi assistir novamente. O interessante foi que tive uma leitura completamente distinta do filme. Se anos atrás apenas enxerguei um bom bang-bang, desta feita enxerguei uma história com uma proposta bem mais profunda e uma poderosa mensagem.





Resumindo, temos sete pistoleiros (cada um com seus objetivos, sonhos e demônios) que se unem para ajudar um vilarejo mexicano a se libertar de um opressor que lhes tira todos os mantimentos obtidos no árduo trabalho no campo, sempre deixando o suficiente para que não morram de fome. O pagamento dos sete pistoleiros é baixíssimo, mas como não há uma oferta melhor no momento, eles aceitam o trabalho.

Quando chegam ao vilarejo são recebidos com um misto de celebração e medo. Celebração por significarem um possível fim da tirania sob a qual vivem. Medo por serem pistoleiros, assassinos de aluguel. Tanto que todas as jovens da aldeia são escondidas nas montanhas pelas famílias que temem abusos sexuais.

Grande parte do filme se ocupa em mostrar como cada um dos pistoleiros acaba sendo envolvido pelo espírito fraterno e de justiça e honestidade que existe no vilarejo. No meio dos preparativos para enfrentar o tirano e exibindo suas qualidades com armas e estratégias de combate, todos eles vivem experiências pessoais que lhes abrem um outro mundo. Como cada um deles tem sua própria história, as experiências são diversas e vivenciadas com maior ou menor intensidade.



Estimulado por estas experiências, há uma cena (rara em westerns) em que os sete pistoleiros estão reunidos ao redor de uma mesa e conversam sobre a realidade que criaram com as armas em suas vidas. E de como esta vida agora pode ser questionada. O pistoleiro jovem e em busca de fama defende esta vida, os mais experientes a questionam e refletem. O mais velho deles tem um forte pesadelo numa cena posterior, evidenciando as lembranças violentas que o acompanham.

Uma traição faz com que eles sejam pegos de supressa pelo bandido e sua gangue. Este mostra-se surpreendentemente benevolente e os liberta longe do vilarejo, após recolher suas armas, sob a justificativa que “ladrão que rouba de ladrão tem 100 anos de perdão”.

Em clara desvantagem numérica, tendo a traição do líder do vilarejo como pano de fundo e sem pagamento, realizam uma breve reunião e decidem voltar para lutar. O mais frio e calculista dos pistoleiros não concorda e vai embora. Mas como é de se esperar, volta no momento X para lutar com os amigos.

E assim ocorre o final épico em um violento combate. O incrédulo líder dos bandidos ainda tem tempo de perguntar, antes de morrer, “Vocês voltaram, por quê?”. Fica sem resposta. Quatro dos sete pistoleiros morrem neste combate. O mais jovem dele acaba ficando no vilarejo por ter encontrado o amor e outros dois pistoleiros deixam a cidade na clássica cena final do cowboy cavalgando para o infinito, parcialmente coberto pelo The End.



Quando acabei o filme, pensei comigo: “Que exemplo fantástico do poder de um propósito!” 

Fui pesquisar e me surpreendi com o que encontrei. O filme é a versão western de um filme de 1954 do mestre japonês Akira Kurosawa de 1954, “Sete Samurais”. O Western foi lançado em 1960 e visto naquele ano por mais de 90 milhões de pessoas em todo o mundo. Sua trilha sonora ficou eternizadas nos comerciais do “Homem de Marlboro”. É o segundo filme mais reprisado na TV norte-americana, apenas atrás do “Mágico de OZ”. Está em inúmeras listas do tipo “os melhores filmes de todos os tempos” e é considerado como um dos melhores westerns já produzidos em Hollywood. E teve uma nova versão gravada em 2016 com Denzel Washington no papel de Yul Brynner. Em um ano disponibilizado no YT, tem mais de 10 milhões de visualizações

Fiquei sem compreender como o filme não despertou a minha atenção antes. Cada um com seus lapsos ...



O que este filme tem a ver com propósito de marca? Tudo.

É uma ótima maneira de torná-lo tangível – O PROPÓSITO - sem palavras abstratas. 

Passe o filme para os seus colaboradores e depois estimule a discussão sobre o motivo de sete pistoleiros voltarem ao vilarejo para defender seus habitantes sem nada receber em troca, colocando suas vidas em risco. 

O que os motiva?

É o valor de agir por algo que faz sentido. 

Digo que o propósito encanta porque nasce dentro da organização (vilarejo). Ele estimula o bem. Exalta a ética, dignifica o respeito e valoriza a justiça. Apoia a iniciativa, investe em desenvolvimento e sustentabilidade. Constrói integridade. Serve o ser humano. O propósito autêntico emociona, envolve e inspira. Sempre. Seja em 1954 ou hoje.




Tanto inspira que, em uma cena que retrata o jantar dos pistoleiros no vilarejo, um deles enaltece a quantidade e o sabor da comida. Um outro pondera e afirma que esta é a comida reservada unicamente para eles, já que os moradores mesmo comem bolinhos de farinha com água e um pouco de feijão. Na próxima cena vemos os pistoleiros dividindo sua refeição com os moradores.

Se o vilarejo é a organização, quem constrói a marca? São os fazendeiros. Sua representação é feita por inúmeros figurantes de roupas brancas e chapéus de palha de abas largas. Não é uma pessoa, é um grupo heterogêneo que cria a identidade da marca.

Ele representa o “algo maior”, traz o valor do trabalho, da coletividade, da justiça e da não-violência. Que em determinado momento precisou recorrer aos pistoleiros para combater um inimigo com habilidades que não possuem e que era maior do que eles. Mas não mais perene.

Há muitas marcas com um propósito autêntico, firmemente enraizado na cultura organizacional. Mas sem comunicá-lo de maneira clara e de fácil compreensão. Os habitantes do vilarejo fazem isto com maestria durante boa parte do filme, explicando não em palavras, mas em atos, o que é viver ali. Qual é a cultura daquele lugar.

Estas marcas sofrem com a concorrência agressiva e desleal no dia a dia e esquecem-se que podem criar e estimular o amálgama interno para superar os desafios que as pessoas do mercado impõem. Contratem “pistoleiros”. 

Ao final do filme, o sábio do vilarejo diz que os pistoleiros são como o vento. Tem sua função, balançam as plantas no campo, passam e seguem adiante. São passageiros, não perenes.

O que me lembra uma citação de Johann Wolfgang von Goethe (1749 - 1832): “Was glänzt, ist für den Augenblick geboren, Das Echte bleibt der Nachwelt unverloren.”.  Algo como “O que reluz nasce para o momento. O que é genuíno permanece intacto para a posteridade.”

Este algo “genuíno” construído pelos fazendeiros é o propósito. É o que fascinou Akira Kurosawa quando produziu “Sete Samurais” e que apenas 6 anos depois estimulou o diretor John Sturges a filmar o “The Magnificent Seven”






É o que explica como um western alcançou os números que obteve e se mantém atual, tendo respeitáveis 62 anos nas costas.

Quando você torna a cultura (o "genuíno") da sua organização tangível e compreensível para o seu público interno e externo na forma de um propósito, você TOCA CORAÇÕES. E ao fazê-lo, sua marca transcende o patamar de possuir um bom produto ou serviço para tornar-se memorável. 

Contrate pistoleiros.

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