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A Marca Consciente


A Marca Consciente é aquela que sabe da importância de se manter o equilíbrio à mesa. 

Se houve uma pessoa que compreendeu o equilíbrio entre o que se pega e o que se traz à mesa, essa pessoa foi Mahatma Gandhi. Desde criança eu gostava dele. Sempre curti a sua cara com aquele óculos redondos e o ar de quem está prestes a fazer alguma travessura. Mas não entendia bem a mensagem dele.

Fui estudar depois como é que essa mensagem se tornou um legado. Como, tantos anos depois e vindo de um país do outro lado do mundo, essa mensagem continua tão presente no cotidiano de todos nós?

Surpreendi-me ao entender que aquele franzino homem, de vestes despojadas e que vivia uma vida muito simples, era um gênio em comunicação. 

O resultado do meu estudo está aqui. Publiquei-o originalmente no LinkedIn em junho de 2020.


O SEGREDO DA MARCA CONSCIENTE: CRIAR ALEGRIA

UMA AULA DE MAHATMA GANDHI


Mahatma Gandhi em uma comunidade de Bhangi, Nova Deli. (Todas imagens de Gandhi: News 18 Photogalley / Getty Images)

Mahatma Gandhi criou o movimento da resistência não violenta e liderou a campanha pela independência da Índia do Reino Unido. Inspirou e inspira movimentos pela liberdade em todo o planeta até hoje com sua visão de justiça. A força de seu nome é inegável e infindável. Qual o seu segredo? 

Simon Sinek diria que ele teve um “why” (propósito) extremamente claro. Ele fascina e emociona.




Um vídeo obrigatório para compreender o propósito da marca. 

Ao definir o propósito da Apple "Em tudo o que fazemos, acreditamos em desafiar o status quo. Nós acreditamos em pensar de forma diferente. A forma que desafiamos o status quo é fazendo nossos produtos muito bem projetados, fáceis de usar e com uma interface amigável. Acabamos fazendo excelentes computadores, quer comprar um?" Sinek prova estar certo.

Um propósito claro e bem formulado emociona. E a emoção sempre foi e será a chave:

"Toque o coração do seu cliente antes de tocar a sua carteira." 

Ao focar o ego dos "inconformados" com seu propósito - além de unir design e hardware primorosos, estruturando cuidadosamente as interações com seus clientes em todos os pontos de contato - a Apple criou uma emoção única - um misto de surpresa, deleite, amor e conectividade. Esta emoção criou uma comunidade com rituais, como o registro do desembalar e ligar de um novo iPhone em inúmeros filmes no YouTube.

É o nirvana das marcas: ter o consumidor falando espontaneamente - e bem - de você.

Conhecemos também a expectativa nos meios de comunicação quando a Apple faz sua apresentação anual e as filas frente às lojas quando do lançamento dos seus novos celulares. Tudo resultado de um propósito bem definido e uma estratégia lapidada nos mínimos detalhes. Que o consumidor percebe em todos os momentos de sua jornada. Assim criou-se a emoção hoje associada à maçã. O sucesso e o valor da marca falam por si só.

Mas Gandhi desconhecia termos como brand purpose, customer experience e tantos outros que surgem incessantemente. Ele nunca possuiu um logotipo, não teve uma estrutura profissional de comunicação - pelo menos nada comparável à estrutura da Apple. Com recursos mediáticos perto de zero, como ele conseguiu motivar multidões na Índia? Como, tantos anos após sua morte em 1948, ele segue sendo um exemplo? Seu aniversário, 2 de outubro, é feriado nacional na Índia e em todo o mundo celebra-se o Dia Internacional da Não-Violência.

Mahatma Gandhi obteve este reconhecimento ao executar - provavelmente por pura intuição, mas com certeza, por fé em suas convicções - três fatores com extrema competência.

 

1.    Mahatma Gandhi tinha um propósito.





Um propósito definido e calcado sobre um valor que poucas vezes encontra espaço legítimo no competitivo mundo corporativo: enaltecer a dignidade do ser humano. Respeito, igualdade e liberdade foram bandeiras erguidas em sua jornada que culminou com a independência da Índia em 1947.

Foram bandeiras sem o viés da lucratividade. Sem o viés do marketing. O que multiplica o fascínio pelo propósito de Gandhi que mostrou seu poder na impressionante cooperação entre indianos que promoveram sistematicamente a desobediência civil em atos pacíficos.

Hoje vivemos em um mundo que insiste em nos fazer acreditar que o caminho para vencer é a competição, não importa como. O grande erro que cometemos, é aceitar e passar a confiar nisso. Pior, continuamos a ensinar errado.

Quando alguém como Gandhi rompe esta crença, fazendo-nos acreditar em um propósito que fala da viabilidade de um mundo participativo e cooperativo, ficamos fascinados com a mensagem.

"Vibramos com a cooperação em uma sociedade que nos ensina que o caminho é a competição."

Possuir um propósito autêntico, baseado em valores reais do DNA da empresa - não em estratégias comerciais desenhadas por terceiros - é o primeiro ponto chave para o sucesso de uma marca. A Apple foi fundada em 1976 como Apple Computer. Apenas em 1997, ao definir seu propósito, traduzido no claim Think different, a marca começou a se tornar o que é hoje.




O famoso anúncio da Apple com Muhammad Ali que iniciou o reposicionamento da empresa segundo o seu propósito de “pense diferente.” O próprio Gandhi aparece brevemente no primeiro filme da Apple com este posicionamento . 

 

2.    Mahatma Gandhi ousou comunicar.




Mahatma Gandhi iniciando um discurso em Pune, Índia. 

Em todas as partes do mundo existiram, existem e existirão pessoas que compartilham o propósito e valores que ele defendia. Talvez até com mais fervor. Mas sem a ousadia de comunicar que Gandhi tinha. Não me refiro à capacidade oradora, mas à coragem de levantar a voz pelo que acreditava, pela sabedoria de fazer as perguntas certas e à inteligência de saber o momento, a maneira e o local para disseminar suas mensagens.

Gandhi vivia - e mostrava - no que acreditava. Residia em uma humilde comunidade autossuficiente, trajava roupas comuns feitas à mão e seguia uma dieta vegetariana simples. Isto conferia veracidade às suas mensagens, potencializando-as.

Sua mais famosa citação "Seja a mudança que você quer ver no mundo" ele poderia ter completado como segue:

“Seja a mudança que você quer ver no mundo e comunique-a.”

Encontrei muitos empresários com propósitos dignos, em alguns casos praticando-os em suas empresas, mas sem comunicá-los. E encarei olhares incrédulos ao afirmar que na prática do propósito estava o grande diferencial da empresa e o valor central para erguer sua estratégia de comunicação. "Mas como, se o que fazemos é o certo? É óbvio fazê-lo. Como isto pode ser um diferencial?"

Quem é consciente, pratica a cooperação, trabalha com ética e age com respeito visando a sustentabilidade social, ambiental e econômica, enxerga-se executando uma função pouco espetacular, sem a necessidade de comunica-la.

Gandhi nos ensina o oposto em sua jornada. É uma função espetacular, que precisa e merece holofotes para ser vista e replicada.

Urge erradicar o modelo mental que considera deselegante ou impróprio comunicar uma postura ética, correta e a prática da cooperação. Urge, no Brasil em especial, sobrepor-se ao sentimento misto de impotência e inutilidade frente à voracidade de sistemas políticos e econômicos desequilibrados e comunicar claramente o propósito da marca consciente.

“Quem não comunica não é visto e quem não é visto, não existe.”

Cito Charles Bukowski "The problem with the world is that the intelligent people are full of doubts, while the stupid ones are full of confidence." para explicar o conflito que vive a/o gestora/gestor da marca consciente e que ela/ele precisa vencer.

Possuir a ousadia de comunicar - com orgulho - o seu propósito, marcar seu território, é o segundo ponto chave para o sucesso de uma marca.





A Apple reforça o seu propósito em atender os que pensam diferente com outra abordagem em seu segundo filme de 2014. 


 3.    Mahatma Gandhi falou ao coração das pessoas.




 Mahatma Gandhi, com um grupo de simpatizantes em Londres durante sua visita em 1931. 

Ele atingiu o âmago delas. Conectou-as com nossa maior verdade interior: somos um. Estamos todos interconectados e fomos desenhados para cooperar. Intuitivamente ou conscientemente, esta verdade reverbera com mais ou menos intensidade em todos nós. É algo que mal somos capazes de formular, mas percebemos. É o sentimento de plenitude ao sermos corretos, éticos e justos. Por nós, por nosso semelhante e pelas gerações futuras. 

Temos o anseio de cooperar, de ensinar. É nossa natureza. Desmond Tutu, Prêmio Nobel da Paz em 1984 por sua luta contra o Apartheid, ensina que devemos assumir nossa interdependência, reconhece-la e ter consciência que somos, porque pertencemos:

"We are because we belong.”



 Desmond Tutu (Cena do documentário I AM de Tom Shadyac)

Até hoje as pessoas ao redor do globo, mesmo não tendo experimentado a opressão vivida pelo povo indiano, enxergam suas crenças pessoais promovidas com coragem na manifestação não violenta de Gandhi. E abraçam o seu mensageiro.

Não por ele, mas pela alegria que a mensagem desperta nelas. A alegria de levantar a voz pelo que acreditam. Simplesmente pela alegria de ser.

Marcas costumam mirar a satisfação em ter. É ter o último modelo do Apple Watch no pulso. 

Possuir o talento de falar ao coração das pessoas com a consciência de que a alegria de ser inspira mais que a de ter, é o terceiro ponto chave para o sucesso sustentável de uma marca. Há mais marcas que possamos imaginar com esta consciência. Esbarram na ousadia de comunicar o seu propósito.


JOY IS ALL



A marca consciente cria alegria quando entra com a bola - seu propósito - na quadra. Não se faz pontos com a bola no vestiário.

Marcas que possuírem a consciência de apontar seu propósito na direção da alegria de ser - e ousarem comunicá-lo - envolvem, inspiram e abraçam pessoas que reconhecem suas crenças pessoais refletidas nas atitudes da empresa.

Ao promover o ser - como substantivo e como verbo - assumindo sua responsabilidade e o seu papel protagonista na criação de uma nova realidade, a marca consciente constrói com solidez e perenidade sua preferência na mente e no coração do consumidor.

É uma tarefa fácil? Não. É árdua e muitas vezes ingrata. Ainda mais no Brasil e, justamente por isso, mais necessária de ser abraçada pelas empresas conscientes, porém, equivocadamente silenciosas. É necessário comunicar o trabalho pela sustentabilidade social, ambiental e econômica. Ao promover a cooperação não se nega a competição, mas nega-se a competição ilimitada e a busca do lucro máximo a qualquer custo.

Há cada vez mais pessoas ansiosas por esta abordagem buscando marcas íntegras e autênticas. São consumidores ávidos pela alegria real criada por um propósito ético de marcas que entendem serem parte de algo maior. Este é o caminho.

Para as marcas fica o aprendizado da rota trilhada por Mahatma Gandhi: ter um propósito é o primeiro passo. O segundo é comunicá-lo. O terceiro passo é servir as pessoas. Construir integridade. A marca é abraçada ao criar alegria. Ela é nosso maior anseio. Alegria é tudo.

Convido-o a assistir o meu Manifesto JOY IS ALL.

A marca consciente está aqui para criar, brilhar e deixar alegria. É opção de fazê-lo é dela.

Se desejar, deixe um comentário ou conte-me como você enxerga o legado de Gandhi.














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